no teu amor por mim há uma rua que começa

É a frase de Ruy Belo que me levou a comprar, poucas semanas atrás, a camisola mais cara da minha carreira de consumidor. Sobre a cor laranja, uma faixa a preto e branco invadida de fumo prenuncia imagens discretas que não se conseguem decifrar; debaixo, o verso citado e a assinatura do poeta. Nada mais.
Há um mês que me persegue. Pela aparente imperfeição, sobretudo - parece faltar balanço à frase, onde está a palavra "sempre" que ali se ausenta?, que pouca ambição parece demonstrar! Tudo quanto não é dito: e no meu amor, o que há? Essa rua vai dar onde? A um lugar bom ou mau? Chego a percorrê-la? Amo-a, sequer?
Directamente, nada disto é cinema; é uma peça de roupa com um pouco de poesia. Mas a imagem longa de fumo e vultos escondidos por detrás lembra uma tela, a tela que apresenta o fotograma inicial de qualquer filme, porque todas as formas podem ganhar os seus contornos a partir daquela névoa principial.
Quanto ao verso, poderia ser uma deixa, é claro. Mas serve aqui, sobretudo, o propósito de começar. Essa rua que sempre nasce de qualquer afecto e que ninguém nos diz onde levará, deixando todos os finais em aberto.
Aqui começa, com caracteres de script, a sua rodagem.
Alexandre Borges

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