grand slam


Pessoalmente, transponho para Woody Allen a mesma analogia que os norte-americanos estabelecem entre o sexo e a pizza. Explico-me. "When it's good, it's really good; when it's bad, it's still pretty good".
Não é que "Match Point" seja a melhor noite de Woody Allen que já tivemos, mas é, seguramente, a mais importante para a sobrevivência da relação desde "Deconstructing Harry" - e já lá vão 9 anos.
Por que não é suficiente para reatar a paixão inicial? Porque sentimos falta do stand-up transversal do próprio Allen, debitando aforismos sobre o amor e as mulheres e a morte e os homens e o sexo. Porque não há sequer, pela primeira vez, um alter ego dele. Porque esta Londres não faz esquecer aquela Nova Iorque. Porque a ópera não se digere tão bem quanto o jazz. Porque Jonathan Rhys-Meyers não é, afinal, grande coisa como actor. Porque há cenas (como a do encontro inicial entre Chris (Meyers) e Nola (Johansson) que deixam demasiado a desejar em matéria de subtileza de diálogo para ser verdade. Porque há demasiadas coisas (como a sequência do crime) que não podemos levar a sério, num filme que - pelo menos, parece - quer ser levado a sério.
Por que é o bastante para saber que este é um casamento para toda a vida? Porque Woody Allen não consegue fazer um mau filme. Porque recupera a criatividade e a audácia suficientes para se reinventar (antes do falhado "Melinda & Melinda", vinham quatro filmes onde era difícil encontrar as 10 diferenças). Porque, ao contrário de outros títulos pelos quais talvez tenhamos, até, mais afeição, "Match Point" não é uma conjunto de partes donde retiramos apenas as memoráveis, mas um todo, bem conceptualizado e contextualizado, da primeira à última cena, entre as duas maneiras de lidar com o destino - traduzível pela metáfora que dá título ao filme - aceitar a sorte ou carregar a culpa. Nesse sentido, importa reter as referências dispersas a Dostoievsky e, já agora, ter lido "Crime e Castigo" (embora se possa, muito legitimamente, questionar se, para se gostar de Woody Allen, seja preciso, agora, andar a ler clássicos russos - a resposta é: 'Não. Mas ajuda.'). Tenha-se presente o plano final do rosto de Chris, olhando, solitário, pela janela, quando, na sala em que se encontra, todos festejam o nascimento do seu filho.
AB

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