o amor, a vida e os elefantes


Estreias: ÁGUA AOS ELEFANTES

De: Francis Lawrence

Com: Robert Pattinson, Reese Witherspoon, Cristoph Waltz

Ah, sim. Um crítico também tem mãe. E nem sempre é fácil recomendar-lhe filmes. O crítico escreve maravilhas sobre películas conceptuais iranianas, reflexões japonesas acerca da condição humana, ficção científica filosófica que levanta questões sobre a morte e a criação – e a mãe, que bem o conhece, não gasta um tostão no bilhete ou no dvd. Quando se encontram, ela pergunta piedosamente que filmes estão em cartaz que ele aconselhe (sabendo de antemão que não irá ver nenhum; trata-se apenas de averiguar do estado depressivo da cria) e ele, é claro, auto-censura-se e opta por falar de doenças.

Pois, eis um filme para a mãe, a mãe que não tem culpa de ter tido um crítico (na altura, só lhe disseram: “É um menino!”), a mãe que, como todas as mães, só quer ver uma boa história, com bons sentimentos e valores morais.

Realizado pelo director de “Eu Sou A Lenda” (qualquer semelhança é pura coincidência) e adaptado do romance homónimo de Sara Gruen por Richard LaGravenese, o mesmo argumentista que assinou a adaptação de “As Pontes De Madison County”, “Água Aos Elefantes” tem esse travo antigo, tradicional, de que se fez muito do encanto do cinema. Não inventa nada nem tem essa ambição. Quer ser um filme que poderia ter sido feito há 50 anos e esse recato, na era da tecnologia, sabe a saudável ousadia.

Jacob (Robert Pattinson) estuda medicina veterinária numa universidade reputada. É bom aluno, feliz, tem uma rapariga debaixo de olho. Até ao dia em que recebe a notícia de que os pais morreram num acidente. Subitamente privado do mundo que sempre conheceu, parte sem destino com o único propósito de deixar a vida que teve até ali e que tão brutalmente deixou de ser possível. Então, ao contrário de qualquer um de nós, que seria atropelado, ignorado, ou que, na melhor das hipóteses, conseguiria uma curta boleia para outro sítio com tanto ou tão pouco sentido como o ponto de partida, o rapaz é levado para o comboio que transporta uma grande companhia de circo. A fuga, a salvação e o próprio filme estão garantidos.

Tendo por pano de fundo uma direcção artística cuidada, à maneira dos tempos áureos da 20th Century Fox, Francis Lawrence filma com arte e rigor pelo estreito e romântico cenário do comboio, acompanhando a viagem de Jacob dos vagões dos empregados mais humildes à carruagem de August (Christoph Waltz), o dono do circo, e de Marlena (Reese Witherspoon), a mulher de August e aquela por quem Jacob, óbvia e erradamente, se apaixonará.

De viagem em viagem, de montar em desmontar da tenda, descobrimos o inesperado: que há vida em Robert Pattinson. Não muita – ainda estamos longe de o ver cometer loucuras como rir ou gritar – mas está provado que mexe e respira. E é com esses novos poderes que vai disputar com August o amor de Marlena, enquanto trata dos animais, com Rosie à cabeça, um fabuloso elefante-fêmea agarrado ao whisky que, para o bem ou para o mal, rouba aos seres humanos todas as cenas em que entra. Já Christoph Waltz devia pensar duas vezes antes de aceitar outro papel que seja um sucedâneo do seu fabuloso Coronel Hans Lada de “Sacanas Sem Lei”. Sobretudo se tiver de contracenar com um actor com o dobro da altura.

Sempre em boa marcha (ou não estivéssemos num comboio), “Água Aos Elefantes” avança com segurança em direcção a um final previsível e delicodoce. A SPA vai adorar (a Sociedade Protectora dos Animais; não a Sociedade Portuguesa de Autores) e as mães não darão o seu tempo por mal empregue. O crítico só lhe dá três estrelas porque prefere coisas menos melosas e mais inventivas, mas confessa que gostou do elefante.

AB

i, 2011.05.05

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