Veneza, tantos canais e não dá nada de jeito
Estreias: O TURISTA
De: Florian Henckel von Donnersmarck
Com: Angelina Jolie, Johnny Depp, Paul Bettany
Por onde começar? Por Angelina Jolie, que, em cada cinco filmes que faz, só se aproveita um? Por Johnny Depp, que arrisca acabar os seus dias no museu da marioneta? Pela desilusão com o trabalho do impronunciável Florian Henckel von Donnersmarck ou pela ligeireza do filme? Pelo filme? Ok.
“O Turista” é mais um remake. E mais um remake particularmente escusado porque o filme original – “Anthony Zimmer”, de Jérôme Salle – data desse longínquo ano de 2005. Mais: esse original é francês. Ainda se poderia remotamente entender uma adaptação ao gosto norte-americano, mas, se era esse o objectivo, para quê recrutar um realizador (e co-autor do argumento) alemão?
Von Donnersmarck é o director de “A Vida Dos Outros” que, em 2007, ganhou o óscar de melhor filme em língua estrangeira. Que resta desse refinado autor nesta sua segunda longa-metragem? Decepção e talvez uma pequena frase – que nem podemos garantir não estar já no filme original – quando o vilão ameaça o rosto de Jolie com uma faca e diz qualquer coisa como “Não queira saber como o mundo trata mulheres sem a sua beleza”.
“O Turista” é a história dum homem que não está lá, o que até poderia ser muito interessante, mas não é, porque no fim – desculpem estragar a surpresa – ele aparece. Alexander Pierce é procurado há dois anos a meias entre a polícia e uma organização criminosa por ter desaparecido com 700 milhões de euros. A única pista que polícias e ladrões podem seguir para lhe chegar é acompanhar, a par e passo, a vida de Elise (Jolie), a namorada, subitamente forçada a uma vida celibatária. Um dia, Elise recebe finalmente um sinal do amado: um pequeno bilhete a pedir-lhe que embarque no comboio que sai à hora x do sítio tal e que lá procure um homem que se pareça com ele para iludir a polícia. Especula-se que Pierce se tenha submetido a uma série de cirurgias plásticas e tenha hoje um aspecto totalmente diferente e, por isso, tudo o que Elise deve procurar é alguém com compleição física semelhante. O feliz galardoado é Frank Tupelo (Johnny Depp), um vulgar professor de matemática, presentemente em passeio que o distraia dum desgosto de amor. O resto da fita tem lugar em Veneza, onde bons e maus perseguem o pobre Frank, convencidos de se tratar da nova identidade de Pierce.
O resultado tenta ser cool e bem-humorado, mas confunde comédia com ligeireza narrativa e esquematismo das personagens. Do ponto de vista da acção, estão lá as intenções, mas falha a mão do realizador. A verdade é que um qualquer tarefeiro do género faria melhor porque aqui a sensibilidade de von Donnersmarck parece tão perdida como a de um requintado chef francês a quem pedissem uma bifana no pão.
Quanto ao elenco, a única boa notícia é a oportunidade de rever Timothy Dalton, agora no esplendor dos 66 anos. Já Paul Bettany desperdiça o talento a fazer de bobo da corte. Angelina Jolie foi a Veneza passear os lindos olhos e arejar uns vestidos. E Johnny Depp compõe um indivíduo comum com tantos tiques que tememos que, a qualquer momento, se transforme no capitão Jack Sparrow.
Só num ano muito mau se compreende que “O Turista” tenha três nomeações aos Globos de Ouro – uma para melhor filme em comédia ou musical (Jesus Cristo) e outras duas para actriz e actor principais (Deus seja louvado) e que Depp ainda acumule com outra nomeação pelo seu Chapeleiro Louro de “Alice No País Das Maravilhas”.
Na verdade, um título mais acertado teria sido “Os Turistas”. Seria uma legenda mais adequada a estas filmagens do bonito passeio que Depp, Jolie e companhia foram dar a Veneza.
AB
i, 2011.01.06
Comentários
É pena, mas nem para assistir a belos planos de Veneza vale a pena. Não sei quem é este Von Donnersmarck, mas aqui revela-se muito fraquinho.