é o fim do mundo como o conhecemos (e eu sinto-me bem)

2012

De: Roland Emmerich

Com: John Cusack, Amanda Peet, Chiwetel Ejiofor

Esqueçam “O Dia Da Independência” e “O Dia Depois De Amanhã”. “2012” é “o” filme-catástrofe. O Cristo-Redentor tomba do Pão de Açúcar, a cúpula da Basílica de S. Pedro rola pela praça, a Torre Eiffel, a Capela Sistina, a Casa Branca – vai tudo desta para melhor. É o regresso do fim do mundo, mas ainda mais assustador e irresistível.

De acordo. Não é com esta descrição que convencemos a jovem intelectual do 2º esquerdo a um serão de cinema, mas há sempre a loura atlética do 5º frente. Ou a aspirante a terrorista suicida que conhecemos no facebook. O importante é que nem só de filmes indy e dramas psicológicos vive um cinéfilo – de vez em quando, todos precisamos dum blockbuster para desenjoar da metafísica.

Roland Emmerich é um especialista do género. Ele e Michael Bay, aliás, disputam um prémio qualquer atribuído ao tipo que, no fim da carreira, tiver feito explodir mais quilómetros quadrados de civilização. Mas Bay tem a mania das guerras, com umas historietas de amor à mistura, e Emmerich é o apocalipse puro e simples. E anda a apurar o estilo, em busca da calamidade perfeita, qual pedra filosofal do colapso. Com “2012”, está quase lá.

O enredo, em si, não importa nada. O Sol anda a fazer umas explosões maiores que o normal e o núcleo da Terra ressente-se. Lentamente, derrete-se a matéria que segura a crosta ao manto e os continentes começam a viajar alegremente por aí, chocando, estilhaçando-se, invertendo pólos e hemisférios, submergindo, enfim, todo o género de catástrofe, numa espécie de “Best Of” das tragédias naturais. Junta-se-lhe uma profecia maia qualquer que diz que o mundo vai acabar em 2012 e estamos conversados. O resto são as maravilhas do digital. Apontem nas vossas agendas: na 82ª Cerimónia de Entrega dos Óscares, três vão direitinhos para “2012”: os dois do som e os efeitos especiais.

Mas se quiser tentar um argumento derradeiro com a jovem intelectual, diga-lhe que, na verdade, quer ver o filme porque ouviu dizer que os actores vão bem. John Cusack na liderança, Amanda Peet pela terceira vez a seu lado, Danny Glover e Woody Harrelson em bons secundários, a sempre agradável à vista Thandie Newton e um nome que já vai valendo a dificuldade de o decorar: Chiwetel Ejiofor (“Infiltrado”, “Filhos Do Homem”).

É claro que vai levar com muita demagogia sobre quem deve ser salvo para assegurar a continuidade da Espécie e quem tem de ficar para trás. Sobretudo, conte com muita americanice. É defeito antigo de Roland Emmerich – indivíduo que, para que conste, é alemão. Temos outra vez um Presidente mais bondoso que Gandhi, uma família presidencial mais cândida que os três pastorinhos e dois terços do filme só se ocupam mesmo da destruição dos Estados Unidos – o facto de o mundo inteiro estar a ir pelo cano é um detalhe chato que alguém se lembra de apontar ao fim de hora e meia.

Mas, a partir daqui, “2012” preenche as quotas: vai a todas as super-potências, incluindo emergentes– Rússia, Brasil, Índia, China – e distribui tempos de antena, guardando África para um final poético, num truque hábil, mas que lhe fica bem. O resto são duas horas e meia de prender a respiração. Tentamos resistir porque é só mais um blockbuster desmiolado, mas temos o pé a bater de nervoso miudinho, a mão agarrada à cadeira, a cabeça a dar, em silêncio, instruções às personagens: corre! Salta! Não vás por aí! Olha a miúda!

Enfim, momentos embaraçosos que nunca confessaremos. “2012” é apenas mais um filme-catástrofe, uma mentira megalómana. Mas, se um dia, o cinema deixar de mentir, terá abdicado de grande parte da sua missão.

AB

i, 2009.11.12

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