o testamento do sr. eastwood



Um tipo assiste a Gran Torino e maldiz a hora em que perdeu mais uma madrugada a ver os Óscares. Podemos tentar acreditar na bondade da Academia, no sentido comercial das distribuidoras, mas, quando vemos mais uma pérola de Clint Eastwood chegar às salas a meio de Março, no fim da festa de endeusamento de Kate Winslet e do encontro de irmãos holly-bollywoodiano de Slumdog Millionaire, só temos uma palavra a dizer: gaita.

Seja ou não o último trabalho de actor do senhor Eastwood, este é, em boa verdade, o seu testamento. A confissão de um conservador com a bandeira americana plantada no alpendre, capaz de vencer o preconceito e apaixonar-se pelos vizinhos asiáticos. Gran Torino é Clint a assumir a velhice, a dificuldade em compreender a geração seguinte (veja-se a cena breve em que Walt, a sua personagem, desanca o jovem Trey, interpretado pelo seu filho, Scott Eastwood); é Clint a olhar a morte nos olhos e a dizer, com todas as letras, que morrerá em paz.

Este pequeno-filme-com-tudo-dentro é ainda uma lição especial: aprende a ser homem com Clint Eastwood em apenas duas horas. Precisas duma mulher, um trabalho, um carro e uma caixa de ferramentas. Também podes ter uma arma, mas este Clint já não é Dirty Harry. Harry, no final, só confiaria em si e resolveria o assunto pelas próprias mãos; Walt – e é difícil não nos comovermos com isto – oferece-se em sacrifício para que seja a sociedade a fazer justiça.
AB

Comentários

Anónimo disse…
Impecável analise. Realmente é um verdadeiro testamento cinematografico (o que até dá medo só pela possibilidade de vir a ser real) mas, acima de tudo, é a prova viva de que não existe no universo do cinema norte-americano, alguém com o poder criativo de Eastwood. E claro, até poderá ganhar o óscar no ano que vem pelo projecto que tem sobre o Mandela (que cai sempre bem) mas são estas pérolas maravilhosas que nos deixa que nos arrancam todas as dúvidas: como este "monstro" não voltará a pegar na camara ninguém!

Um abraço e abaixo deixo a minha humilde perspectiva.

http://ocinema.blogs.sapo.pt/62344.html
noite americana disse…
Fui lê-la. Plenamente de acordo, também. Um abraço e obrigado.
frosado disse…
Alexandre, é a melhor análise que eu li sobre o filme e olha que já li várias.
Anónimo disse…
Olha a Fátima! Muito obrigado. Um grande abraço a ti e ao Luís!

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