um pesadelo num cinema perto de si


PESADELO EM ELM STREET

De: Samuel Bayer

Com: Jackie Earle Haley, Kyle Gallner, Rooney Mara

Wes Craven fez “Pesadelo Em Elm Street” em 1984. Se o filme era bom ou mau, já ninguém se lembra. O que importava era Freddy Krueger. O rosto queimado e o chapéu, a mão com lâminas em vez de dedos e a camisola listada de Freddy; as vozinhas de crianças cantando a canção de Freddy. Havia um filme à volta? É possível. Mas o que ficou foi uma personagem, um arquétipo do terror – e não é pouco.

O problema é que Freddy se tornou numa espécie de Anita e perdeu todo o potencial aterrador. Sequelas e sequelas depois, já pouco importava se saía um “Freddy Contra Jason” ou um “Freddy No Campo”, “Freddy Faz Amigos”, “Freddy Aprende A Andar A Cavalo”.

Em 2010, na irritante era do remake, alguém se lembrou de que há já uns aninhos que ninguém pegava em Freddy e vai de voltar ao título original para ganhar mais uns cobres (só nos Estados Unidos e em apenas três semanas, a receita já vai em 56 milhões de dólares). E como, para fazer dinheiro, é irrelevante se o filme é bom ou mau, ainda se poupou uns trocos entregando a realização a um director de videoclips, sem qualquer longa-metragem no currículo.

Uma coisa podemos garantir: o novo “Pesadelo Em Elm Street” assusta. Assusta de mau. De ridículo. Assusta por saber que alguém viu o filme na sala de montagem e disse: “Isto chega.” E assusta sobretudo porque, de facto, chega.

Na versão 2010, temos um conjunto de jovens naquela idade irreal típica de mau filme americano: têm algures entre 16 e 25 anos, mas são todos da mesma geração. Andam no liceu, mas já conduzem (sempre grandes carros). E dormem todos em belas vivendas de janelas abertas por onde alguém, a qualquer momento, entra – a questão dos quartos serem no primeiro andar é um pormenor irrelevante para esta geração com super-poderes.

E qual é o argumento, admitindo que há um (certos sites garantem mesmo terem sido escritas 18 versões)? Um a um, os jovens vão aparecendo mortos, depois de serem visitados em sonhos por Freddy Krueger. Os amigos sobreviventes chegam rapidamente a esta conclusão e, a partir daqui, o único objectivo que perseguem é manter-se acordados. Um plano brilhante: pois, ora morrem às mãos de Freddy, ora vítimas dos speeds e do red bull. Os pais assobiam para o lado, os miúdos vão adormecendo e quinando e coragem que amanhã é outro dia. Até que uma luminária diz: espera aí. A cara daquele tipo não me é estranha… E vai de procurar fotografias no sótão e lá chega a uma conclusão: o Freddy era o jardineiro da escola primária onde todos eles andaram, abusou deles e foi morto à paulada por causa disso. Portanto, estamos perante não uma, mas duas coisas espantosas: ponto um, em vinte miúdos, nenhum se lembrava de que tinha sido sexualmente molestado há coisa de dez, quinze anos; ponto dois, os pais, não querendo fazer a juventude recordar-se de coisa tão traumatizante, optaram por deixar os filhos irem tombando um a um, às mãozinhas maldosas de Freddy, regressado em pesadelos para se vingar.

Não há lógica narrativa interna na passagem dos sonhos à realidade, não há tensão nem terror e nem sequer a figura de Freddy faz qualquer progresso em relação ao original. Aliás, é verdadeiramente espantoso que, com toda a evolução tecnológica de 26 anos, o novo rosto de Freddy seja menos assustador que o de 1984. E que, por debaixo da máscara desfigurada, sintamos que, por vezes, nem Jackie Earle Haley acredita nos chavões de terror que vai debitando.

“Pesadelo Em Elm Street” versão 2010 é apenas plantar Freddy Krueger num banal filme de terror para adolescentes. Sem ele, não haveria nada. Com ele, é Freddy contra nada.

AB

i, 2010.05.20

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