o 'X' que não marca o tesouro

Houve, entre os estúdios americanos, uma época dos filmes-catástrofe; uma época dos filmes armados em espertos, com mais twists que argumento; uma época de suposto neo-realismo, outra para os contactos alienígenas, enfim, épocas para tudo, até que alguém se lembrou que o tempo estava bom para filmes sobre super-heróis. Num ápice, soltaram-se Spiderman, Batman, Hulk, Fantastic Four, Electra e outros e, daqui a dias, o próprio Superman. Mas, por ora, temos mesmo de nos haver é com o último dos X-Men.
Comecemos pelas boas notícias: já não há muito mais super-heróis para adaptar. Agora, as más: Brett Ratner, Halle Berry, um argumento armado aos cucos, um festival de lugares-comuns.
A única virtude de X-Men III – The Last Stand é arriscar-se a filmar ficção científica sob a luz do dia, ao contrário de qualquer outro filme do género, mas até esse mérito já vinha de Bryan Singer e das duas primeiras películas. Todos os efeitos especiais perdem força, mas há que louvar a coragem de não fazer de conta que é sempre noite no mundo. O resto, isto é, o filme em si, é suportado por Ian McKellen e Patrick Stewart, que são tão bons actores e possuem vozes tão extraordinárias que poderiam estar a ler rótulos de champô que a plateia ouvi-los-ia, na mesma, deleitada.
Do ponto de vista da história, X-Men III tenta enfiar o Rossio na Betesga – como sabemos, uma expressão muito popular em Hollywood. Em menos de duas horas, morrem três heróis, uma ressuscita e vários perdem os seus poderes; arranja-se uma cura para o “mutantismo”, rouba-se a cura, usa-se a cura de modo errado, acaba-se com a cura; mete Presidente dos Estados Unidos, a ponte de S. Francisco a voar, o genocídio dos mutantes, a salvação dos mutantes, bom: tudo.
Pelo menos, ficamos com algumas certezas. Nomeadamente a de devíamos ter dado atenção às nossas senhoras quando nos garantiam que Halle Berry não era boa actriz enquanto padecíamos de doença espasmódica ao vê-la sair, em biquíni laranja, da praia de James Bond: Die Another Day, e a de que, não, não era impressão nossa, Brett Ratner é mesmo talhado para obras de maior pendor metafísico como a saga Rush Hour. Quanto a Jackman, para usar outro dito corrente em Beverly Hills, ele que continue a fazer papéis destes e não se ponha a pau, não.
Por uma vez, portanto, o ‘X’ não marca o tesouro. E, afinal, quando precisarmos de super-heróis, teremos sempre Tim Burton.
AB
texto publicado na Atlântico nº 16

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