Intempéries


Se a adesão da Turquia à União Europeia dependesse do último filme de Nuri Bilge Ceylan a entrada estaria garantida.

Como não depende resta um filme magnífico, como há muito não via.

O texto de Luís Miguel Oliveira é muito bom, exceptuada a desconcertante passagem...
" Embora o filme de Ceylan nada tenha a ver com o cinema de Eric Rohmer, por comodidade descritiva diremos que "Climas" mima a estrutura básica dos "contos morais" do cineasta francês..."

...e toca num ponto que aqui pretendo desenvolver, o da plasticidade da personagem principal masculina. As suas contradições, naturalmente humanas, expressam-se contra as palavras. Não só pelas que não diz mas também por aquilo que faz.

Nunca diz amo-te, frase sonhada pela mulher Bahar; amachuca de forma displicente a morada de um taxista de província que lhe pedira uma cópia de uma fotografia em que servira de modelo; mente à mulher no mesmo momento em que, pela única vez, promete honestidade.

À parte isto, porém, as palavras convivem com outros actos (que acompanhamos na intimidade dos seus passos solitários) que parecem prometer um homem procurando algo de bom.

Mas, afinal, talvez esse algo bom não seja mais do que uma ilusão com que nos enganamos comummente: a felicidade. Isto pode ser assim, pois, sempre que Isa está perto de conseguir chegar onde promete, segue noutro caminho. Assim, como Bahar, sempre que parece chegar está, afinal, enganada.

Neste jogo de desencontros é normal que a dissolução de tudo, incluindo da carne, seja o desenlace mais natural. Mas esse desenlace é irrelevante: parte porque previsível, parte porque nem por isso menos arrebatador. Como o clima.
DM

Comentários

Carlos Pereira disse…
Um filme belíssimo que Ceylan nos oferece!
Anónimo disse…
O filme ainda não vi.
A fotografia aqui apresentada é lindíssima.
Fazemos face à intempérie lutando pelas nossas convicções em nome dos que não tem voz ou meios para fazer valer a sua. Acreditamos nisso.
Espreitem o nosso blog.

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