Um anjo na América

Michael Igor Peschkowsky, nascido em Berlim, chegou até mim através de Working Girl, que até hoje considero como um ícone do cinema dos anos 80 e, de certo modo, uma despedida dessa década fascinante. Tenho até hoje o filme gravado em VHS e é talvez o único filme em que gosto de ver Melanie Griffith. Working Girl foi o primeiro por muito pouco pois certa noite, algum tempo depois, apanhei Dustin Hoffman na televisão em The Graduate. Desse filme guardei Katharine Ross que viria a encontrar não muito mais tarde em Butch Cassidy and The Sundance Kid. Mas isso são contas de outro rosário e nesta altura The Graduate não me marcou e Nichols não ficou como mais do que o realizador (irrelevante) de Working Girl. Com Regarding Henry voltaria a encontrar-me com o cinema de Nichols, mas não tanto com ele. Talvez por ser ainda muito novo, talvez por não achar ali uma mão especial, não encontrar ainda nada que unisse e que fizesse destacar um certo cinema. 

O momento de viragem chegaria no São Jorge, primeira vez que contactei com o cinema de Nichols... num cinema. Com um grupo de amigo fui ver Wolf. Gostava de o rever agora pois só tenho a memória da adolescência e dos lábios de Michelle Pfeiffer e posso estar a idealizar um filme medíocre. De qualquer modo foi nesse filme que pensei, pela primeira vez, em Nichols como realizador: quem era ele, quem tinha feito aquele filme. 

Depois, durante cerca de 10 anos não voltei a tropeçar em Nichols. Até Angels in America. Para mim, esta série marca o início de uma nova geração de mini-séries, onde também integraria Band of Brothers ou John Adams. Grande elenco e grandes realizadores. Angels in America - revi-a há uns 2 anos - é um marco na história da televisão pelo modo como retrospectivamente analisa o surgimento e o confronto ocidental com o HIV. Os desempenhos, onde se destaca Al Pacino, são maravilhosos. E há uma bela combinação entre dramatismo, onirismo e até alguma ironia. 

Mesmo tendo depois visto Primary Colors, Closer e Charlie Wilson's War, a minha memória de Nichols ficaria para sempre associada a Angels in America. Aliás estes três filmes replicam muitas das características que passei a associar a Nichols, uma delas bem difícil de encontrar: a capacidade de associar temas pesados a um ritmo de entretenimento, criando um objecto estranho. Isso acontece tanto em Primary Colors e Charlie Wilson's War. Closer é outra coisa. Simplesmente um bom drama romântico. E um dos filmes preferidos da minha mulher. Também por isso lhe estou agradecido. 

Mas como a obra de Nichols inclui ainda muita coisa que nunca vi, como Catch-22, Biloxi Blues ou Carnal Knowledge, ainda vou reencontrar-me com ele algumas vezes.

DM

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